Renato Figueiredo e Maricá, a união que deu acesso à Sapucaí

Renato Figueiredo e Maricá, a união que deu acesso à Sapucaí

Por Ricardo Maia
Fotos: divulgação

Renato Figueiredo nasceu em março de 1979, em Cascadura, onde morou por três anos somente e logo após se mudou com sua família para Cavalcanti, no qual conheceu o Grêmio Recreativo Escola de Samba Em Cima da Hora. À época, segundo Renato, o bairro era bem residencial, com poucas opções de entretenimento para a criançada, que ora jogava bola, no Campo do Mangueirão, na linha do trem, ora soltava pipa, ou por vezes, estava na quadra da escola participando de eventos comunitários que a própria Em Cima da Hora realizava. Naquele tempo, ele começou a se encantar pela agremiação recreativa ao ver de perto os preparativos do carnaval realizados pela Azul e Branco de Cavalcanti.

A paixão pelo carnaval aumentou em 1984, quando a Em Cima da Hora desfilou com o enredo do “33 – Destino D. Pedro II”. Renato ficava fascinado ao comtemplar a comunidade descendo o morro para fazer a construção de carro dentro da quadra. Anos mais tarde, ele estudou numa escola onde as atividades extras eram feitas na quadra da agremiação de Cavalcanti. O contado com as escolas de samba evoluiu, sobretudo quando seu pai o levava para as quadras da Portela e do Império Serrano.

Apesar disso, ele não vislumbrava trabalhar com o carnaval, seu gosto era de participar, de entender os enredos e de se informar sobre todo o processo de todas as escolas. Já na adolescência, como um simples folião, Figueiredo escutava os LPs antigos, lia os encartes enormes que falavam dos temas, do samba e do histórico das agremiações.

Anos depois, morando em Itaipuaçu, durante uma viagem à cidade do Rio de Janeiro, se deparou com uma propaganda sobre um curso de formação de gestores de carnaval, parceria formada entre a Universidade Estácio de Sá e a Liesa, e não perdeu tempo, se inscreveu e foi aprovado para cursar a faculdade. Por incrível que possa parecer, nos primeiros dias de aula, Renato quase desistiu do curso, porém no seu primeiro dia como aluno, assistiu e se encantou com a palestra de Alexandre Louzada, carnavalesco campeão com a Vila Isabel em 2006. A partir dali sua empolgação com a faculdade aumentou bastante, especialmente por ser aluno de seus próprios ídolos como Milton Cunha, Haroldo Costa, Helena Teodoro, entre outros artistas renomados do carnaval que faziam parte do corpo docente.  

Já no segundo período do curso, Milton Cunha o convidou para fazer parte da equipe de produção de um espetáculo realizado na Cidade do Samba. Renato ficou no projeto por cerca de 15 a 20 dias, quando Alexandre Louzada lhe disse: “Você vai produzir mais num barracão. Se você for trabalhar comigo no carnaval, vai criar junto comigo, e isso é muito mais fascinante”. Figueiredo chegou a brincar com Louzada: “Ok! Quando tiver uma oportunidade, você me chama”. Alexandre respondeu: “A oportunidade é agora. Amanhã você começa”. O amanhã, de acordo com Renato, foi no mesmo dia. Louzada o pegou e o levou para o barracão para trabalhar como estagiário. Em 15 dias, ele foi contratado pela Beija-Flor.

Isso tudo aconteceu em 2007.  De estagiário, passou a assistente, integrou a equipe artística da Comissão de Carnaval da Beija-Flor, onde teve a oportunidade de criar algumas fantasias e alegorias desde a criação até a concepção. Depois disso, Renato Figueiredo realizou alguns trabalhos em outras agremiações. Ele voltou para a Em Cima da Hora como gestor de carnaval, trabalhou no Gato de Bonsucesso e desenvolveu alguns projetos para escolas do Rio Grande do Sul.  

Convidado para fazer parte da fundação da União de Maricá (2015), com a incumbência de ajudar na estruturação, Renato assumiu como carnavalesco no segundo ano. Em 2018, a escola foi campeã da Série Bronze com o enredo “100Sacional! Um Maxixetico e Rebolativo Baile”, de sua autoria. Hoje aos 43 anos de idade e com uma vasta experiência na bagagem, o carnavalesco realizou o sonho de toda a comunidade da União de Maricá: desfilar pela primeira vez na Marquês de Sapucaí com o acesso conquistado este ano, ao assinar o enredo “Eu sigo nordestino”.

Nesta entrevista ele fala de todo o processo para chegar à Sapucaí e de como será o trabalho, visando o próximo carnaval.

OBatuque.com – Renato, a União de Maricá conquistou o título de campeã da Série Prata. Qual a representatividade desse título para a escola e para o município?

Renato Figueiredo – A União de Maricá nasceu com os propósitos de ser uma escola de samba que enxerga o carnaval muito além da “festa”. Entendo que as agremiações devem ser reconhecidas como instrumentos de arte, cultura e cidadania, com toda a vocação para formar e transformar a sociedade através das suas contrapartidas sociais e, logicamente, alcançar a meta e estar apta a desfilar no mais emblemático palco carnavalesco, que é o Sambódromo Darcy Ribeiro, na Avenida Marques de Sapucaí.

OBatuque.com – As conquistas ano a ano, tanto no carnaval quanto na estrutura e a visão social, em tão pouco tempo de existência, são obviamente motivos de muito orgulho para a escola e toda a cidade de Maricá. E dentro desse propósito de uma escola diferente, como tem sido a história da União de Maricá? Quando foi fundada, quem foi seu fundador e idealizador?

Renato Figueiredo – A União de Maricá foi fundada em 26 maio de 2015, no mesmo dia do aniversário da cidade. Ela foi idealizada, principalmente, pelo prefeito de Maricá à época, Washington Quaquá (PT-RJ). Diversas lideranças da cultura e do carnaval da cidade completaram o quadro de fundadores.

OBatuque.com – Vamos falar de carnaval. Como foi o caminho para chegar a esse título? Qual era o teu pensamento e dos dirigentes em relação ao caminho para levar a Unidos de Maricá à Sapucaí?

Renato Figueiredo – Desde 2019, ano que estreamos no antigo Grupo B, atual Série Prata, a escola vinha buscando ganhar corpo, se preparando para o dia que chegasse à Sapucaí. Pela minha experiência no carnaval sempre entendi e tentei passar para os dirigentes o tamanho do salto que seria sair da Intendente para a Sapucaí. Agora, com o acesso conquistado, a prioridade inicial é resolver a estrutura física da escola: barracão, alegorias e atelier, para ter as condições de criar e desenvolver um carnaval apto à Sapucaí.

OBatuque.com – O teu trabalho plástico é brilhante. Mesmo nas limitações financeiras da Série Prata, você repetidamente conseguia que a escola levantasse a plateia. Qual a tua “mágica” para conseguir esse resultado?

Renato Figueiredo – Muito estudo e busca constante por novas técnicas e materiais que tragam novas possibilidades para a construção de fantasias e alegorias. Minha busca constante é por fazer algo que agrade aos olhos do público e dos jurados, mesmo sendo com materiais de baixo custo. O bom gosto não tem preço!

OBatuque.com – É surpreendente a facilidade que você tem para encontrar soluções para as dificuldades. Parece que a solução e o plano B estão sempre no bolso. De onde vem tanto jogo de cintura e criatividade?

Renato Figueiredo – Reafirmo: o estudo constante. Mas também ressalto o fato de já ter feito diversos carnavais na Intendente, onde o tempo e a estrutura são geralmente escassos. Esse costume faz o artista ganhar experiência para se pensar, junto ao projeto original, os planos b, c, d… Eu, por exemplo, ao desenhar um figurino, já vislumbro todas as possibilidades de materiais para, caso tenha dificuldades em ser concretizar o projeto inicial, opte logo pelas demais alternativas, otimizando assim o tempo para a construção das peças.

OBatuque.com – Na Série Ouro, você pretende manter um trabalho simples e alegre de materiais baratos ou pretende partir para o luxo?

Renato Figueiredo – O luxo cada vez mais está ficando fora do carnaval. O ideal é seguir o caminho da criatividade e da busca constante por materiais e técnicas que possibilitem um bom processo de desenvolvimento do trabalho.

OBatuque.com – Joãozinho Trinta falava que o “povo gosta de luxo…” Você não acha que o público sente falta do luxo, das plumas…?

Renato Figueiredo – O entendimento dele era pertinente lá nos anos 80. Hoje não cabe mais da forma que foi colocado. O exemplo das plumas é ótimo, pois cada vez mais a opinião pública clama pela não utilização de materiais de origem animal. Ainda tem questão dos preços muito altos. Hoje existem diversos materiais e técnicas que podem ser utilizados no lugar das penas de animais, que dão efeitos maravilhosos. O luxo de hoje em dia tem que ser o bom-senso, e eu gosto!

OBatuque.com – Você pensa que talvez seja o caminho mais fácil para conquistar o público com carnaval luxuoso?

Renato Figueiredo – Não! Acho que o que conquista o público é o um bom conjunto da obra, a começar por um bom enredo, defendido em uma boa sinopse, que vai ajudar a gerar um grande samba e em consequência a plástica da escola. Tudo isso inflama, em princípio, os componentes da escola que, automaticamente, transmitem a boa energia para o público em geral.

OBatuque.com – E então, conta para nós: não dá um frio na barriga só em pensar que agora você vai desfilar contra Unidos de Padre Miguel, Império Serrano, União da Ilha e outras gigantes do samba que são esperadas pelo público que, como preliminar, receberão a União de Maricá?

Renato Figueiredo – Procuro não pensar nos adversários e sempre foco no meu trabalho. Sempre agi assim. Acredito que ficar pensando nos outros só vai me trazer mais preocupações e não vai mudar em nada no meu carnaval e no dos adversários. No último desfile, por exemplo, eu não sabia praticante nenhum enredo das outras escolas e nem as posições de desfile. É algo meu. E não quer dizer desrespeito às coirmãs, pelo contrário, é uma forma de tentar me blindar da qualidade das demais.

OBatuque.com – Interessante isso. Nos fale mais: você não procura ver enredo, protótipos, nada das concorrentes? Como isso te beneficia?

Renato Figueiredo – Não me interesso por nada das concorrentes. Foco no meu trabalho. Acredito que isso me deixe mais tranquilo em relação ao que pode vir pela frente. O processo de construção e desenvolvimento de um desfile, por si, já é algo desgastante. Ao invés de me preocupar, eu procuro me ocupar trabalhando.

OBatuque.com – Mas isso não te isola em não saber se a tua escola será a melhor ou a pior da avenida? Isso não te preocupa?

Renato Figueiredo – Nem um pouco! Tenho que ter em mente que preciso sempre procurar a excelência dentro das condições de tempo e estrutura que vou ter disponível. Volto a afirmar: ver o desenvolvimento de outra escola não vai mudar as condições que eu tenho para trabalhar, pelo contrário, pode atrapalhar o meu processo criativo. Logicamente que eu sei o tamanho que tenho que levar para a avenida. Ainda mais agora, sendo na Sapucaí. E assim continuarei trabalhando.

OBatuque.com – Como você vê a União de Maricá daqui a uns 10 anos?

Renato Figueiredo – Espero, estruturada e apta a começar a brigar pelo (Grupo) Especial.

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